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‘Futuros Cientistas’ investigam o rio Belém e transformam vivência em pesquisa

Por: Mari Martins

O programa Água & Ação, da UFPR, soma forças aos estudantes do clube que investigam a poluição do rio Belém

Um grupo de estudantes caminha em fila às margens do rio Belém, vestidos com uniformes azul-marinho com detalhes em verde e a inscrição “Paraná Integral” nas costas. Eles seguram pranchetas e fazem anotações enquanto observam o ambiente ao redor. À esquerda da imagem, em primeiro plano, aparecem duas placas de trânsito: uma azul e branca com os dizeres “Aqui passa o rio Belém” e outra amarela em formato losangular escrito “Rua sem saída”. Ao fundo, é possível ver casas de telhado vermelho, árvores e um céu parcialmente nublado. A cena transmite a ideia de investigação em campo, com os alunos registrando observações sobre o território.
Durante saída de campo, clubistas registram observações feitas às margens do rio Belém (Foto/ Mari Martins)

Com pranchetas nas mãos, os integrantes do Clube de Ciência ‘Futuros Cientistas’ deixam o portão da Escola Isolda Schimid acompanhados pela professora Anna Julia Foggiatto e por integrantes do Água & Ação, um programa de extensão da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Seguem pelas ruas até o primeiro ponto onde começam a acompanhar o rio Belém. Ao longo do caminho, observam bueiros, árvores e lixeiras, anotando em fichas preparadas antecipadamente cada detalhe da paisagem. A cena, registrada em agosto, integrou uma das saídas de campo do clube, que investiga como a degradação do rio impacta a vida da comunidade e, ao mesmo tempo, busca criar soluções acessíveis para o território.

A origem da iniciativa, como explica a coordenadora do clube, a professora Anna Julia, está diretamente ligada à localização da escola e ao cotidiano das famílias dos alunos. “A ideia central deste projeto surgiu justamente devido à localização da nossa escola, situada a apenas quatro quadras do rio Belém. Ele se comunica diretamente com a realidade dos nossos alunos e seus familiares. A grande maioria mora nos arredores do rio”, afirma.

Da proximidade com o rio nasce a decisão de transformar a vivência em pesquisa. O objetivo não é apenas observar o problema, mas questionar suas causas e os limites das políticas públicas de preservação. “Tentamos, juntos, criar soluções viáveis e fáceis, pois queremos, acima de tudo, que a comunidade se sinta pertencente a este rio e que, juntos, possamos agir para recuperar um rio que faz parte do nosso jardim e que pode gerar momentos agradáveis a todos que ali perto vivem”, completa a professora.

Durante a saída de campo, uma das atividades é a análise da água. De cima da passarela que cruza o Belém, a equipe do Água & Ação lança um balde para coletar a amostra, que depois é examinada pela professora Regina Kishi, coordenadora do programa, com os equipamentos levados pela universidade. Enquanto ela explica o procedimento, os alunos se reúnem ao redor, atentos e curiosos, fazendo perguntas tanto sobre os passos da análise quanto sobre a qualidade da água.

Além do aprendizado técnico, a atividade reforça a ligação dos estudantes com o território. Muitos convivem diariamente com os efeitos da poluição e encontram no clube uma forma de transformar essa realidade em investigação científica. Heloisa, de 12 anos, expressa essa percepção: “O rio Belém é o mais perto da escola. O cheiro, às vezes, vem para cá, fica aquele cheiro horrível. Incomoda, né? Então a gente decidiu ver o que estava acontecendo e daí a gente descobriu que as pessoas jogam bastante lixo e a gente está trabalhando sobre isso.” O relato da adolescente reforça o vínculo entre as observações cotidianas e o planejamento do clube.

O grupo pretende avançar com ações diretas na comunidade. Como destaca a professora Anna Julia: “Temos várias ideias e propostas, mas inicialmente, o foco é propor e agir diretamente na comunidade. O programa Água & Ação é uma parceria importante para esta etapa. Uma ação muito bonita está programada, e se tudo der certo, este ano ainda sairá do papel”, projeta.

Na avaliação da professora, além do impacto imediato na comunidade, os Clubes de Ciência também cumprem um papel mais amplo na escola pública, oferecendo novas perspectivas para os alunos. “Só quero ressaltar aqui, a importância dos clubes de ciências nas escolas públicas. Este programa permitiu que muitos alunos pudessem vislumbrar algumas possibilidades no seu futuro, que antes pareciam impossíveis. Permitir que o aluno seja criativo e protagonista da sua vida, é incrível. Eles crescem enquanto estudantes e criam o sentimento de pertencimento, mudando, quem sabe, o rumo da própria história.” A experiência da escola também dialoga com reflexões mais amplas sobre os rios urbanos.

RECONEXÃO COM O RIO E A CIÊNCIA CIDADÃ

Desde 2016, o programa Água & Ação atua na mitigação de problemas como enchentes, deslizamentos e degradação ambiental nas margens de rios urbanos. Articula saberes técnicos e experiências comunitárias, e essa trajetória ajuda a compreender a relevância da parceria com o clube. A iniciativa amplia a reflexão sobre o rio Belém ao inserir os estudantes em um movimento mais amplo de educação ambiental e ciência cidadã.

A professora Regina, coordenadora do programa, explica: “Acredito que a parceria traga impactos significativos guiados pela premissa de que o entendimento gera ação.” Em sua visão, os efeitos também alcançam o território ao unir diferentes atores em torno do cuidado com o rio. “Une universidade, escola e moradores em uma rede colaborativa para diagnosticar problemas, como instabilidade de margens e poluição, e cocriar soluções, de mutirões a programas de monitoramento. O impacto primordial, porém, é a reconexão afetiva com o rio, transformando-o em um elo de união para uma cidade mais resiliente.”

Ela ainda destaca a importância da interação entre diferentes níveis de ensino, como “uma via de mão dupla formativa”. Para os alunos do ensino fundamental, o diferencial está em participar de atividades práticas de engenharia: organizam dados coletados na caminhada, tomam decisões em jogos educativos e constroem protótipos em oficinas, por exemplo. Desenvolvem, assim, um pensamento mais sistêmico e projetual. Já para os universitários, o exercício de traduzir conteúdos complexos para crianças aprofunda a própria compreensão e estimula habilidades como comunicação e liderança.

As perspectivas para a continuidade do trabalho também apontam para essa dimensão ampliada. “Minha expectativa central é que os alunos desenvolvam um novo olhar sobre o rio, compreendendo as relações de causa e efeito por trás da poluição e das enchentes, e vejam a ciência como uma ferramenta para resolver esses problemas. Espero que se sintam agentes ativos na preservação e que alguns se motivem a desenvolver tecnologias ambientais. Para isso, desenhamos uma jornada de três etapas: fundamentação teórica (com o jogo consolidando o aprendizado), investigação de campo (com medições técnicas no rio) e prototipagem tecnológica (quando visualizam na prática como podem construir soluções acessíveis, como sensores de qualidade da água).”

A reconexão afetiva com o rio aparece, assim, como ponto de partida para repensar a relação das pessoas com seus territórios. Ao aproximar ciência e comunidade, o projeto mostra que preservar os rios urbanos exige tanto conhecimento técnico quanto vínculos simbólicos capazes de sustentar o cuidado coletivo.